Ambientalistas, comunidades ribeirinhas, autoridades locais e população em geral querem mais transparência e maior fiscalização na gestão e aplicação dos recursos públicos destinados à preservação dos rios que compõem a Bacia do São Francisco em Minas Gerais. A demanda foi apresentada na manhã desta quarta-feira (21/8), durante audiência pública promovida pela Comissão Extraordinária das Águas da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), em Três Marias .

Na reunião, cuja finalidade foi ouvir os comitês de bacia da região e discutir as questões relacionadas ao uso da água e à gestão de recursos hídricos, surgiram ainda outras reivindicações. Uma delas, defendida pela presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Pará, afluente do São Francisco, Regina Célia Greco Santos, é a revisão da legislação estadual sobre recursos hídricos. O objetivo seria desburocratizar o repasse das verbas para os comitês, viabilizando o seu funcionamento.

A ambientalista sugeriu também que os deputados intercedam junto ao Governo do Estado para que as verbas destinadas aos comitês sejam liberadas por intermédio da Secretaria de Meio Ambiente, de forma a agilizar o processo. Ela relatou a luta do comitê para concluir o plano diretor de recursos hídricos do Rio Pará, instrumento que norteia a utilização das verbas públicas para esse fim. Segundo ela, entre os itens que merecem maior atenção estão as estações de tratamento de esgoto e os aterros sanitários. Entre os projetos positivos, que vêm dando bons resultados, ela aponta o de captação da água de chuva, iniciado em 2000.

Conquista – Ao abrir a reunião, o presidente da comissão, deputado Almir Paraca (PT), destacou a criação da comissão como uma conquista, acrescentando que uma de suas funções é exatamente priorizar o contato com os comitês de bacia. “A realização da audiência em Três Marias tem por objetivo conhecer de forma mais efetiva o estágio em que se encontram os comitês de bacia que atuam na região”, disse.

Em todo o Estado, há 36 comitês de bacias hidrográficas, dez deles ligados ao Rio São Francisco e três na Região Central, onde se localiza Três Marias, município que abriga uma grande usina hidrelétrica. A audiência pública realizada na cidade faz parte de uma série de 12 encontros regionais que têm por finalidade obter informações dos 36 comitês de bacias hidrográficas do Estado para a elaboração de um relatório com as principais questões relativas aos recursos hídricos mineiros. Os encontros regionais correspondem à primeira etapa das ações da comissão. Posteriormente, pretende-se realizar encontros temáticos para tratar dos assuntos específicos levantados nas reuniões e, no encerramento dos trabalhos, a comissão vai apresentar um relatório final.

Guimarães Rosa – Ainda na abertura da audiência, o presidente da comissão citou o escritor mineiro Guimarães Rosa, que defendeu, em sua obra, a preservação do meio ambiente, em particular da região banhada pelo Rio São Francisco. “Esperamos que Três Marias cada vez mais assuma essa concepção ambiental, já antecipada pelo escritor”, disse, ressaltando que a obra de Guimarães “revela um sentimento de valorização profunda da questão ambiental”.

Lei florestal preocupa

O deputado Almir Paraca também se referiu à lei florestal mineira, que tramita na Assembleia Legislativa, lamentando que a audiência pública marcada para discutir o conteúdo do projeto tenha sido cancelada. A reunião estava prevista para ser realizada na última terça-feira (20), mas foi cancelada em razão da morte do 1º vice-presidente da ALMG, deputado José Henrique (PMDB).

Na opinião de Paraca, contudo, a audiência deveria ser remarcada, e não cancelada. “Uma matéria dessa natureza não poderia tramitar sem uma discussão pública. Isso muito nos preocupa porque a nova lei propõe muitas medidas que vão flexibilizar a legislação sobre o meio ambiente. O impacto será muito grande”, previu.

Transparência – O prefeito de Três Marias, Vicente de Paulo Resende (PMDB), manifestou sua preocupação com a burocracia que dificulta a liberação de recursos para a preservação ambiental. Ele defendeu mais rigor na fiscalização e mais transparência no uso dos recursos gerados pelas hidrelétricas, para que de fato eles retornem para a preservação do rio, em benefício da população.

Segundo ele, o assoreamento do São Francisco é tão grande que não só diminui a quantidade de água, mas a qualidade também. Lembrou que existem um bilhão de pessoas no mundo com carência hídrica e que o Brasil é um país privilegiado, devido à abundância de águas. Mas criticou a monocultura do eucalipto, que "rouba a água do rio", e da soja, que "contamina o rio com agrotóxicos".

O presidente da Câmara Municipal, vereador Sebastião da Fonseca Leal, afirmou que cidadãos, servidores, usuários e gestores públicos têm o dever de garantir os subsídios constitucionais para o desenvolvimento sustentável. “Água é vida, e quanto maior a qualidade da água, maior a qualidade da vida. O interesse pelo lucro se contrapõe aos interesses ambientais e da população”, denunciou.

Tratamento de esgoto – O gerente da Copasa em Três Marias, Eduardo Luiz Rigotto, observou que enfrenta problemas com a estação de tratamento de esgoto da cidade, construída sem a fiscalização da empresa. Segundo ele, por falhas na construção, o gás gerado no processo de tratamento da estação não é recolhido, gerando problemas por seu alto poder de corrosão. “Todas as tubulações internas estão sofrendo corrosão, e o gás pode se expandir para a atmosfera, poluindo o ambiente e gerando mau cheiro”, disse. Por isso, explicou, foi preciso interromper as atividades da estação, para limpeza e reparos, e só mais tarde será possível retomar o tratamento.

Enquanto isso, todo o esgoto da cidade está sendo lançado diretamente no Córrego Barreiro Grande, afluente do São Francisco. Rigotto esclareceu, porém, que já há recursos garantidos por contrato para a conclusão do projeto, que inclui a construção de um emissário para lançar o esgoto tratado diretamente no São Francisco. Com isso, prevê, a situação deve melhorar no prazo aproximado de 90 dias, quando a estação deve retomar suas atividades.

O secretário de Meio Ambiente de Três Marias, Adenilson Rodrigues Rubim, afirmou que o Rio São Francisco está agonizando, porque não aguenta mais tanta intervenção. Ele denunciou as condições de poluição do rio e a situação das populações que, embora vivendo às suas margens, não dispõem de água para viver. “Temos que tratar o rio como gente, como fonte de vida”, concluiu.

A audiência pública foi realizada no Plenário da Câmara Municipal de Três Marias